Ao longo dos séculos assistimos à evolução da educação e vai já longe o controlo das massas através desta e o poder totalitário da igreja sobre a mesma. Não indo tão atrás no tempo, basta observar o fosso que existe entre a educação dos anos 70, cuja inovação foi a telescola que pretendia alargar as possibilidades de aprendizagem às zonas recônditas e rurais do país, e a educação de hoje em dia, do milénio da tecnologia.
Precisamente no início deste milénio começam a emergir os recursos educativos abertos disponíveis na Web. A designação Open Educational Resources (OER) foi usada pela primeira vez durante um workshop da UNESCO em open courseware, em Julho de 2002, para designar a disponibilidade na Web de recursos educacionais abertos, para consulta, utilização e adaptação.
Sem pretender ser controversa e transformar a minha posição num fundamentalismo arcaico, o aparecimento destes novos recursos, assim como a generalidade de ferramentas da Web deixaria decerto Guttenberg em estado de incredulidade. Mas não me cabe, enquanto educadora, defender acerrimamente a manutenção e exclusividade do papel. Pelo contrário, a evidência está aí, à vista de todos, os recursos educacionais abertos devem ser encarados como uma nova revolução, dentro da tecnologia certamente, mas também como elementos complementares no nosso ensino tradicional que devemos abraçar. Não significa que com a utilização destes recursos os alunos deixem de frequentar bibliotecas ou manusear com apreço as páginas de papel de uma edição do “Memorial do Convento”, ou da enciclopédia Lello, significa sim que haverá mais que isso na próxima curva deste caminho. Inovação e tecnologia sempre existirão e de forma crescente e actualizada, a diferença é que já não precisamos de ajudar Blimunda e Baltasar apenas na construção da passarola, precisamos de ajudar na construção, adaptação e aplicação de novos recursos.
A abordagem da Web providencia o potencial de combinar todos os tipos de canais através dos quais o conhecimento pode ser mudado e partilhado, desde o simples texto até às aplicações interactivas de multimédia, permitindo que os participantes desenvolvam um pensamento crítico e competências analíticas em como intervir nesses ambientes e como tirar vantagem da Web para as suas necessidades pessoais de aprendizagem (Brown e Adler, 2008; Weller e Meiszner, 2008).
No contexto dos recursos educacionais abertos adaptar é um verbo elucidativo daquilo que somos enquanto ser humanos e é o gesto do quotidiano de cada um. Enquanto professores adaptamos os materiais às nossas próprias realidades que passam por diferenças na população escolar, faixa etária, língua ou nacionalidade, em suma, diferenças por vezes abismais de uma turma para outra pela heterogeneidade que é inerente a cada um. Providenciar o tipo de educação que ensina sobre e para pessoas de diferentes costumes, crenças, valores é uma tarefa essencial da educação (TRINDADE; SANTOS, 1999). Pegando num exemplo concreto, no meu percurso profissional muitas vezes adapto materiais, e o exemplo mais cabal do verbo adaptar foi ao leccionar português enquanto língua estrangeira a uma turma de chineses, ou seja, do ramo sino-tibetano, tão oposto ao latim em termos linguísticos, e a uma outra turma de galegos. Os recursos usados nunca poderiam ser os mesmos e por isso tiveram de ser adaptados, neste contexto, conforme a proveniência geográfica dos meus alunos.
O sucesso das novas formas de ensino e dos recursos educacionais abertos tem sido crescente e pode verificar-se em inúmeros exemplos, como a criação da Wikipedia uma enciclopédia que cresce diariamente desde 2001, graças à partilha e contribuição de todos e que ultrapassa fronteiras, disponível em diversas línguas, e abarcando o conhecimento em todas as áreas. Ou os cursos que o MIT disponibilizou a partir de 2002, ou as importantes contribuições da UNESCO, da OECD, da William and Flora Hewlett Foundation e da Sun Microsystems. E se estivermos atentos vemos essa evolução diariamente, em novas formas tecnológicas. Ainda no passado mês de Setembro, a Coreia anunciou a sua estratégia para a educação online, tendo a intenção de implementar o sistema digital em todas as escolas do país até 2015, visando modernizar o sistema educacional e facilitar o acesso. Em Portugal vimos este mês o anúncio do governo em reduzir o número de turmas com ensino de português no estrangeiro, para a Federação Nacional de Educação (FNE), a solução para evitar o desemprego que daí advirá e a perda de qualidade no ensino de português no estrangeiro poderá passar pelo ensino à distância. Ora se a tecnologia está aí, o que temos é de a utilizar e aproveitar, e por ela passam os recursos que servem de tema a esta reflexão. A utilização destes permite democratizar o ensino (disponibilizando-os a quem interesse, independentemente da localização geográfica), uma redução de custos e o trabalho colaborativo entre professores e alunos que, consequentemente, levará a melhorias de um determinado recurso, seja ao nível da quantidade da informação, como da qualidade e da forma como esta se apresenta.
Os ganhos e as motivações para o envolvimento com a educação aberta variam dependendo da perspectiva ou do cenário de aplicação. Motivações para os estudantes se envolverem com a educação aberta podem ser de natureza extrínseca ou intrínseca (Meiszner, 2010). As motivações extrínsecas, como obter algum tipo de reconhecimento, estão talvez mais inerentes ao ensino formal, enquanto as intrínsecas, como o interesse num determinado objecto, relaciona-se com o lado da educação aberta.
Os ganhos e as motivações para o envolvimento com a educação aberta variam dependendo da perspectiva ou do cenário de aplicação. Motivações para os estudantes se envolverem com a educação aberta podem ser de natureza extrínseca ou intrínseca (Meiszner, 2010). As motivações extrínsecas, como obter algum tipo de reconhecimento, estão talvez mais inerentes ao ensino formal, enquanto as intrínsecas, como o interesse num determinado objecto, relaciona-se com o lado da educação aberta.
A tendência é recorrer a formas de ensino informais, onde cada indivíduo toma parte no processo de construção do conhecimento, num espaço global aberto a todos. O que nos fará crescer enquanto seres sociais será assumir que o conhecimento é de todos e ele deve ser partilhado, combatendo o egoísmo latente. A paixão de ensinar é a paixão de aprender e vice-versa, daí advém a constante partilha de experiências e saberes fazendo destes momentos de aprendizagem uma cura para a alma Os egípcios definiam as bibliotecas como tesouros dos remédios da alma, hoje em dia esses tesouros atravessam as bibliotecas e recomeçam na Web, em redes digitais, fazendo desses espaços, em conjunto, o mítico El Dorado do conhecimento.
Referências:
Amiel, Tel; Orey, Michael e West, Richard. Recursos Educacionais Abertos (REA): modelos para localização e adaptação
Gurell, Seth (autor) & Wiley, David (editor) (2008). OER Handbook for Educators 1.0. [http://wikieducator.org/OER_Handbook/educator_version_one]
Meiszner, Andreas. The Why and How of Open Education’. United Nations University | UNU-MERIT | CCG: The Netherlands
Weller, Martin (2010). Big and Little OER. In Open Ed 2010 Proceedings. Barcelona: UOC, OU, BYU. [http://hdl.handle.net/10609/4851]
Wiley, David (27-09-2011). On OER – Beyond Definitions. Iterating toward openness. [http://opencontent.org/blog/archives/2015].
Olá, Susana! Excelente post! Gostava só de te colocar uma questão: falas da Wikipédia como um bom exemplo de REA, onde a expressão do conhecimento como construção colaborativa é bem patente; eu gostava de saber como vês os problemas inerentes à fiabilidade dos conhecimentos presentes nas páginas da Wikipédia, dado que são elaboradas pelos próprios utilizadores, sem um filtro de qualidade. Este tipo de REA pode carecer de alguma qualidade: como ultrapassar isto?
ResponderEliminarBom trabalho!
Olá Clara,
ResponderEliminarObrigada :)
Realmente o problema e o obstáculo que sempre surge num trabalho colaborativo do teor da wikipedia é a fiabilidade do mesmo. Penso que a única forma de poder controlar a qualidade, pertinência e coerência das entradas seria existir uma equipa de especialistas que o fizesse. Uma espécie de revisores com competências para tal, e o ideal seria isto ser uma tarefa voluntária, pro bono, pelo bem do conhecimento.
Um abraço,
Susana
Pois, Susana recordo-me perfeitamente da tele escola e de como era maçadora! Mas penso que estás enganada, vai haver cada vez menos interesse por bibliotecas e livros, se podes consultar a partir do teu computador porque te vais incomodar com deslocações a livrarias ou bibliotecas e porque vais gastar dinheiro se podes aceder gratuitamente a partir da net? Se ainda muitos não optaram por essa via penso que é por mero desconhecimento dessas possibilidades ou ausência de competências técnicas. O que dizes sobre a educação formal e informal principalmente quanto a esta última faz sentido e julgo que cada vez mais caminhamos para uma educação informal e uma desvalorização da escola.
ResponderEliminarOlá Lina,
ResponderEliminarDe facto as bibliotecas são mais procuradas por investigadores com alguma experiência e maturidade, a população escolar na faixa etária que engloba os nossos alunos de 3º ciclo e secundário vive em grande afastamento das bibliotecas. Já ouvi por diversas vezes alguns afirmarem nunca terem entrado numa Biblioteca. A internet é um meio com muito potencial, mas lamento este afastamento dos espaços considerados mais tradicionais.